Sigilo processual versos liberdade de imprensa
Juíza federal Ana Paula Serizawa, titular da 4ª Vara da Justiça Federal do Amazonas, responsável pelos interrogatórios dos réus da Operação Custo Político e Estado de Emergência, 2ª e 3ª fases da Operação Maus Caminhos, obrigou na tarde de ontem (8), a jornalista Larissa Cavalcante do jornal Acrítica, a apagar todo o conteúdo que havia sido gravado durante o depoimento do ex-governador do Estado, professor José Melo.
O fato ocorreu após o termino do interrogatório onde a jornalista foi acuada e obrigada a entregar o seu celular para um agente de segurança que estava na porta do auditório, onde aconteciam os depoimentos.
Segundo relatos obtidos pelo site Estado Político, o agente advertiu a jornalista dizendo que não era permitida a gravação e solicitou a entrega do celular da jornalista para levar à juíza responsável.
Em seguida a juíza Ana Paula obrigou a profissional a deletar a gravação realizada, sob escolta inclusive de advogados e representantes do Ministério Público Federal (MPF) que acompanharam a jornalista apagando o conteúdo.
Na faculdade de comunicação e no cotidiano jornalístico, aprendemos que o jornalismo deve atender à sociedade civil ao noticiar, informar, denunciar, escrever e detalhar tudo aquilo que é ou pode vir a ser de interesse público, e que não há como exercer os fundamentos do jornalismo e da comunicação em geral sem ampla e irrestrita liberdade em fazê-lo.
Nota conjunta do Sindicato dos Jornalistas do Amazonas e da Federação Nacional dos Jornalista
O episódio ocorrido em Manaus, chamou a atenção das entidades que resguardam e lutam pela profissão tanto no Amazonas como no Brasil. Em nota conjunta o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Amazonas (SJPAM) e a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) repudiaram a postura da juíza federal Ana Paula Serizawa, que autorizou um segurança a reter o celular da jornalista Larissa Cavalcante, apagando o registro das gravações de vídeo e áudio.
O jornal A Crítica informou que reitera sua confiança na atuação ética de seus profissionais e rechaça qualquer tentativa de obstrução a atividade jornalística e à liberdade de imprensa e lamentou a atuação da juíza, em um texto com o título “Liberdade de Imprensa”.
Leia o texto na íntegra:
Liberdade de Imprensa
Em tempos de escalada de fake news e tsunami de desinformação, o fortalecimento da imprensa livre e independente é mais do que indispensável. Uma das formas de combater a disseminação de equívocos é promover o exercício do jornalismo, feito por profissionais qualificados que primam pela correta apuração dos fatos, com técnica, ética, e com o suporte de empresas jornalísticas sérias e comprometidas em levar ao leitor informações corretas.
Lamentavelmente, o ambiente para o exercício do jornalismo está cada vez mais restrito, até em instituições que, em tese, deveriam primar pela boa informação, como a Justiça. Ontem, uma repórter do jornal A CRÍTICA teve o aparelho celular, usado na ocasião como instrumento de trabalho, retido por agentes de segurança e instada a apagar mídias gravadas. Magistrados podem e devem adotar medidas para garantir o bom andamento dos trabalhos e procedimentos judiciais. Mas o constrangimento a profissionais de comunicação é desnecessário e nunca será aceitável. Não é razoável que o aparato policial a serviço da Justiça retenha aparelhos celulares de jornalistas, tampouco determine a eliminação de conteúdo.
Nota da 4ª Vara da Seção Judiciária ressalta que as mídias foram apagadas mediante autorização da repórter, mas é fato que tal “autorização” se deu em face de evidente pressão e da ausência de alternativas. Um episódio lamentável e totalmente desnecessário. Ressalte-se o bom trabalho desenvolvido na 4ª Vara de forma geral, especialmente no que tange ao relacionamento com a imprensa na cobertura dos desdobramentos da Operação Maus Caminhos, mas o que aconteceu ontem é lamentável. O procedimento poderia ter sido outro, com civilidade e respeito. Bastaria um pedido para que a gravação fosse interrompida. Em vez disso, o que se viu foi uma situação que remete aos tempos mais sombrios de nossa história recente, quando o trabalho de jornalistas estava submetido a uma infinidade de restrições.
O pleno acesso à informação é um dos pilares da democracia. É por essa razão que a Constituição Federal assegura aos profissionais de imprensa o livre exercício da atividade. A imprensa não precisa de barreiras, precisa de liberdade para fazer o melhor trabalho possível e contribuir para o desenvolvimento da sociedade.
Em nota a magistrada informa que: ‘o juiz tem o poder geral de cautela para determinar a forma como os atos serão realizados, inclusive restringido a participação pública, se isso puder causar tumulto ao ato. Taís poderes decorrem da própria Constituição Federal, artigo 93, IX, e do Código de Processo Penal, artigos 792 e 794”.
Confira na integra a nota da Justiça Federal
A principal função do jornalismo é agir em prol da sociedade, tendo um compromisso único com o interesse público. Uma imprensa séria fornece as informações, os fatos, as verdades necessárias para que o público tire suas próprias conclusões e se “autogoverne” – expressão dos jornalistas e teóricos Bill Kovach e Tom Rosenstiel.
Por: Ariana Carvalho